Não é preciso ser economista para se ter uma correta noção intuitiva do que é a inflação. Convém, no entanto, estar atento para manipulações dos índices por governos e economistas, que podem distorcer seriamente qualquer análise. A inflação é o aumento contínuo do nível geral de preços ou diminuição do poder de compra do dinheiro, medida por taxa anual ou mensal. Mantê-la baixa é um dos principais objetivos econômicos da maioria dos governos já que esta penaliza os que possuem dinheiro em espécie não aplicado e que vivem de rendimentos fixos. Pode distorcer a distribuição de recursos alterando os preços relativos, inclusive a taxa de juros reais. Estes pagos após a inflação são menores que os previstos. Os níveis impostos também podem resultar distorcidos. Os consumidores passam a ignorar o preço real de mercado de produtos consumidos com pouca freqüência além de encarecer produtos de exportação e os que competem com os importados, afetando o equilíbrio da balança comercial. Segundo a teoria quantitativa da medida, a inflação ocorre pela quantidade de dinheiro em circulação, e como forma de reduzi-la, os monetaristas sugerem controle rígido da oferta de moeda, tendo como possível conseqüência, um aumento prolongado dos índices de desemprego. Outra teoria diz que a inflação surge quando a demanda de bens e serviços excede a oferta, geralmente como resultado de erros em políticas monetárias ou fiscais ou “o consumo leva a inflação”. Mas um modelo oposto diz, porém que o problema são os custos, que impelem os preços para cima : elevação de preços de importação ou alta de salários, levando a uma espiral dos preços e salários, que aumentariam os custos e assim por diante. Tais políticas ortodoxas anteriormente empregadas, foram mais recentemente substituídas por outras mais indiretas (fiscal e monetária), considerada menos prejudicial aos mecanismos de mercado. A inflação latino-americana foi atribuída nas últimas décadas à dívida externa, aumento de importações e redução das exportações. Todas as medidas de combate, no sistema de governo capitalista, seja liberal ou não, democrático ou não, tem levado a algum dano a população carente.

Os índices de inflação são medidos de muitas maneiras: no caso do Brasil o índice oficial é hoje o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), criado em 1980. Representa as necessidades médias de famílias com renda (salarial ou não) de 1 a 40 salários mínimos em onze capitais brasileiras que contêm 30% da população do país (Rio de Janeiro desde janeiro/1979; Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife desde julho/1979; São Paulo, Brasília e Belém desde janeiro/1980; Fortaleza, Salvador e Curitiba desde outubro/1980; e Goiânia desde janeiro/1991). O IPCA recebeu o adjetivo "amplo" para distingui-lo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), criado em 1979 para representar as necessidades dos consumidores de famílias com renda de 1 a 8 salários mínimos e chefe assalariado. Ou seja, nele as necessidades e preferências da classe média têm um grande peso. Ele reflete o custo de reprodução da vida social, ao passo que o INPC reflete mais estritamente o custo de reprodução da força de trabalho.
No caso dos EUA (e na prática, também dos países que têm sua moeda vinculada ao dólar por uma taxa de câmbio fixa, como a Argentina) o índice oficial é o CPI calculado pelo Departamento de Estatísticas do Trabalho (Bureau of Labor Statistics – BLS), que representa as necessidades médias de uma amostragem de todos os consumidores urbanos norte-americanos, escolhidos entre 87% da população total dos EUA e também dá um grande peso ao consumo das classes médias. O BLS também calcula um índice específico das famílias assalariadas, chamado CPI-W, que é análogo ao nosso INPC e diz respeito a 32% da população daquele país, mas recebe pouca atenção do mercado financeiro.
No Brasil, vale notar, há muitos outros indicadores de custo de vida, calculados por instituições com variáveis graus de autonomia em relação ao Estado, que recebem contínua atenção da imprensa e do mercado financeiro. Para citar os mais importantes em escala nacional, há o Índice de Custo de Vida do Departamento Intersindical de Estudos Estatísticos e Socioeconômicos (ICV-DIEESE, que pesquisa famílias com renda de 1 a 30 salários mínimos), o Índice de Preços ao Consumidor da Fundação Getúlio Vargas (IPC-FGV, famílias de 1 a 33 salários mínimos) e o Índice de Preços ao Consumidor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo (IPC-FIPE, famílias de 1 a 20 salários mínimos). Além disso, ao contrário do que ocorre na maioria dos países, grande parte do mercado prefere confiar não num índice de preços ao consumidor, mas no Índice Geral de Preços da Fundação Getúlio Vargas (IGP-FGV) – uma média mais ou menos arbitrariamente ponderada entre o índice de preços ao consumidor (IPC), índice de preços no atacado (IPA) e índice nacional de construção civil (INCC) como principal indicador de inflação. Paradoxalmente, nos EUA, paraíso da livre iniciativa, não existe nenhum índice de preços ao consumidor amplamente divulgado além do calculado pelo governo federal.
Tudo isso reflete desconfiança – não só por parte dos trabalhadores, como também dos capitalistas – nos cálculos oficiais dos preços ao consumidor, manipulados para subestimar o aumento real de preços durante décadas de inflação elevada. O caso mais grave foi o do período 1973/1974, quando, em pleno auge da ditadura militar, a inflação começou a recrudescer. O próprio ministro Mário Henrique Simonsen, membro da FGV acabou reconhecendo a manipulação num relatório de 1978 intitulado "O problema inflacionário em 1974", onde revelou que o critério de manipulação tinha sido usar os preços tabelados pelo governo, ao invés dos preços realmente pagos pelos consumidores. O IPC oficial foi de 13,7% em 1973 e seu item alimentação de 16,4%, ao passo que os valores corretos respectivos foram de 26,6 e 41,4%. Na década de 80, houve outras tentativas de manipular os índices oficiais do IBGE e da FGV que quase liqüidaram definitivamente a credibilidade dessas instituições.
As forças sociais que têm interesse em subestimar a inflação são muitas e geralmente mais poderosas do que aquelas que podem se beneficiar de uma estimativa realista ou exagerada. Entre estes últimos contam-se, naturalmente, o movimento sindical, os trabalhadores e os pensionistas em geral, mas também empresas cujos preços e tarifas são reajustados em função da inflação por contratos de longo prazo – empresas de energia elétrica e outras concessionárias de serviços públicos, empreiteiras e alguns fabricantes de bens de capital sob encomenda, companhias de seguros e credores de dívidas de longo prazo reajustáveis em função da inflação.
Do outro lado, estão a maioria dos empresários privados, já que o cálculo da inflação é um recurso importante na mobilização dos trabalhadores e do movimento sindical, mesmo quando o reajuste de salários, benefícios e pensões em função do aumento do custo de vida não é garantido pela lei ou por convenções trabalhistas – e também porque parte de suas dívidas pode ser reajustada pela inflação. Além disso, uma inflação aparentemente baixa é um argumento a favor de políticas monetárias frouxas, que (ao menos no curto prazo) beneficiam devedores e empresários em geral e mais especialmente negócios arriscados e especuladores das bolsas.